Yoko e o Mar

Estava numa praia onde o mar recuava. Recuava tanto, que era possível andar sobre o seu leito. Mar adentro..., era a orla que se ampliava. De onde eu estava, via o mar recuar até a linha do horizonte. Com certeza, era uma ilusão de ótica, mas foi la que avistei Yoko e um mar crespo, imenso e cheio de areia se formar, rapidamente, atrás dela... Outras três pessoas estavam ao seu redor. O mar ameaçava quebrar com força. Do meu ponto de vista, Yoko e as pessoas pareciam minúsculas e, acabaram sendo engolidas pelo mar achocolatado e volumoso. Mas, em meio ao rumor do mar, ouvia-se risadas. Palavras soltas, também, chegavam à costa. Então..., o mar se encolheu. Se recolheu, pra começar tudo outra vez. Numa destas vezes, Yoko levou consigo um pequeno cartaz, que dizia: I TRUST YOU. Yoko Ono Desta vez, quando o mar chegou imenso, ela estava só. O mar engoliu Yoko e o papel ficou ricocheteando nas ondas. Depois de algumas manobras na água, o papel voltou pra ela e parou no seu rosto. Ela gritava coisas que eu não podia entender. [Yoko sendo Yoko] Só então, percebi que eu também estava no mar e, ao lado dela. O cartaz, mesmo rasgado, escondia o seu rosto, mas eu pude ler: I TRUST YOU. O papel deslizou e Yoko me viu. Ela apontou pro cartaz, dizendo: - Está feito! - Está feito! Quando acordei, entendi o que a frase - repetida, enfaticamente, por Yoko, queria dizer: Bastava que uma pessoa estivesse junto, experimentando, compartilhando o momento, para que o trabalho, a vida ou o que quer que fosse, existisse. [SONHO na manhã. 27 02 2014] Quase três anos depois, encontrei em Grapefruit - O livro de Instruções e desenhos de Yoko Ono, um texto sobre o mar. Yoko diz: "Uma vez nós éramos peixes Movendo-nos livremente no mar. Nossos corpos eram suaves e rápidos e não tínhamos pertences. Agora que rastejamos para fora do mar estamos secos e cheios de ânsias. Nós vagamos de cidade em cidade carregando a memória do mar (mas não é somente uma memória). Escute muito cuidadosamente e você vai ouvir o mar em seu corpo. Você sabe, nosso sangue é águadomar e nós somos todos transportadoresdemar. de “Sete Pequenas Histórias” - 1ª história A Conexão (original em Japonês) primavera de 1952
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